domingo, 11 de maio de 2014

A Jornada de Esperança - Parte VII

Visitas Inesperadas

          Sinuhe acordou uma hora e meia antes do combinado com Viatilis. Vestiu-se e resolveu passear a esmo por Aldhafera. Zanzando pelos corredores chegou até um elevador e entrou. O elevador não tinha um botão para cada andar. Seus controles estavam numa tela sensível ao toque. Aquele estaleiro espacial era quatro vezes maior que o de Autalun. Uma rápida checagem no menu e Sinuhe percebeu que nem todos os anéis de atracação estavam disponíveis ali. Ele sabia que as docas estavam agrupadas em grupos de quatro anéis separadas por anéis residencias ou industriais. Provavelmente os anéis que não estavam disponíveis ali deveriam estar fora de uso. Seria um bom lugar para caminhar sem ser perturbado por ninguém.

          Ele escolheu um anel de docas no menu que estava só. O Anel Cinza. O elevador foi rápido. Assim que a porta abriu ele foi direto para as escadas. Abriu a porta de acesso e viu o número 27 estampado no verso da mesma. No menu do elevador aquele era o 15º anel disponível. Fechou a porta atrás de si e subiu as escadas para o nível 28. Saiu das escadas, adentrou o hall de acesso e foi até a primeira porta que encontrou. Ao abrir a porta deparou-se com uma grande sala de controles, com largas e altas janelas de vidro, e além delas estava toda uma doca espacial iluminada, mas vazia. Ele achou aquilo um desperdício de energia. Por que manter uma doca vazia iluminada? Fechou os olhos e vasculhou a doca com a mente e sentiu algo estranho. A doca estava vazia, mas a sensação dada por aquele vazio era de alguma forma desconfortável.

 - Será que existe algo aqui se ocultando, por isso a doca está iluminada? – pensou Sinuhe.

Do outro lado dos vidros estava a 22ª cópia de Plumbia, habitando a maior de todas as naves bombas construídas por Aldhafera. Ela estava pronta para partir em direção à estrela Nob quando o Marechal pisou o primeiro degrau da escada. Plumbia concentrou-se ao máximo, erguendo seus escudos para esconder-se da mente do Marechal. Evitou a todo custo lançar qualquer feixe mental de percepção sobre ele, pois isso denunciaria a presença dela. Ela apenas sentia passivamente a presença dele. Podia perceber a mente do Marechal perscrutando toda a doca em busca do que estava ali. Essa agonia durou quase vinte minutos até que a projeção mental de Viatilis se fez presente junto ao Marechal.  Plumbia manteve sua percepção passiva até que os dois saíram da doca. Fora por pouco.

Ela ainda teve que esperar mais cinco minutos. Só depois que perdeu totalmente qualquer vestígio da presença do Marechal que ela retomou seu trabalho. Com o poder de sua mente, desligou as luzes da doca, retirou todo o ar do ambiente e abriu o portão espacial. A nave bomba saiu para o espaço, oculta no campo psiônico da piloto. A doca fechou-se automaticamente atrás dela como programada.  Assim que se afastou de Aldhafera ele desapareceu totalmente de sua percepção. Ela agora só podia ver a lua vermelha e o planeta Bogotol mais atrás. A lua verde estava mais distante ainda, para a esquerda. O mais belo mundo a Resistência era mesmo lindo de se ver do espaço. Plumbia tomou a rota comercial para Autalun em dobra dois. Após duas horas de viagem, Viatilis entrou em contato.

- Com estás, Plumbia.

- Estou bem, Comandante. Mas foi um belo de um susto. A intuição de nosso Marechal é terrível.

- Sim, ele foi diretamente até você. A mais poderosa dos pilotos a bordo da maior nave bomba. Conheço aquele homem já faz séculos, mesmo assim ele ainda consegue me surpreender. Você conseguiu retomar o tempo de nossa programação?

 - Consegui. Tinha apenas 25 minutos de atraso. Vou chegar em Autalun na hora programada, Comandante.

 - Muito bom. Você tem que estar no sistema Nob em exatas doze horas. O asteróide que vai camuflar seu mergulho na Mãe de Todas as Estrelas já está na rota de colisão. Muito cuidado ao contornar o Quasar. Não conseguimos controlar totalmente a poeira de nanomáquinas naquela região, então mantenha-se na rota ou poderá ser detectada. Estamos monitorando a área. Caso ocorra alguma movimentação de nanos, te avisaremos.

- Ok, Comandante. Boa sorte com seu visitante xereta.

- Ele está agora feito criança com brinquedo novo, inspecionando os novos lasers e ogivas de antimatéria. Acho que não vou ter mais trabalho por enquanto. Boa viagem, Plumbia. Peço que Nob a proteja, apesar de nossas intenções.

- Exterminar nossa Deusa Mãe para salvar nossas vidas. Acho que vou ter que contar apenas com a sorte, Comandante. Mesmo assim obrigado. Adeus.

Plumbia seguiu em dobra dois até Autalun. Passou ao largo da doca espacial do planeta e mergulhou em dobra oito em direção ao centro de Nobiloria. Contornou o Quasar pela rota estabelecida chegando na periferia do sistema Nob onze horas após sua partida. Voltou ao espaço normal bem atrás do asteróide que lhe serviria de camuflagem para o mergulho na estrela. O asteróide era dez vezes maior que sua nave, quase com seis quilômetro de diâmetro. Uma caverna fora escavada nele para acolher a nave. Ela atracou na caverna e desligou a maioria dos sistemas, mantendo apenas sua camuflagem e sensores. A rocha levou oito dias para atravessar todo o sistema Nob. No caminho Plumbia pôde ver o mundo natal da GOE - Aguidel. Ele não tinha mais atmosfera e nem sequer um vestígio de vida. Tornara-se uma esfera perfeita de metal. Parecia mais uma estação espacial gigantesca. Ali estava o coração da GOE. Rezam as lendas da galáxia que aquele era o mundo com a maior superfície oceânica de Nobiloria. Aguidel não possuía continentes, sendo qualhado por milhares de ilhas tropicais e suas calotas polares nunca coexistiam. Conforme as estações passavam, uma se formava enquanto a outra desaparecia. Dezenas de drones da GOE pontilhavam o espaço em torno dele.

Finalmente a hora chegou. O asteróide mergulhou na estrela gigante e se desfez antes mesmo de chegar à superfície. Plumbia e sua nave eram agora apenas um ponto mergulhado num mar de fogo atômico azul, mantido a três metros de distância da fuselagem pelos escudos psiônicos.

- Serão dias solitários navegando neste mar de fogo até o mais próximo possível do centro da estrela – pensou Plumbia.

Mas ela não teve tempo de relaxar. Assim que estabilizou a nave nas correntes incandescentes do interior de Nob, ela sentiu uma presença. Uma consciência serena que atravessou com facilidade seus escudos, sem derrubá-los e materializou-se na câmara central da nave. Uma linda mulher humana de cabelos longos azuis surgiu na frente de Plumbia. Ela tinha um par de asas emplumadas também azuis, mas em vários tons. Vestia um tomara-que-caia dourado com uma faixa azul na cintura amarrada nas costas. As pontas da faixa desafiavam a gravidade e partindo da cintura da mulher formavam um arco cada uma, encontrando-se dois palmos acima de sua cabeça. No meio da testa ela tinha um arco de metal dourado que adentrava dos dois lados sobre seus cabelos. Seus olhos eram verdes como esmeraldas com um olhar profundo e sereno. Seus pés estavam descalços.

Plumbia ficou maravilhada com aquela aparição e levou quase um minuto para voltar a si. Quando ela pensou em reagir de alguma forma ouviu uma firme e doce voz feminina.

 - Acalme-se, Plumbia. Sei exatamente quem você é e o que veio fazer aqui, e não tenho a menor intenção de impedi-la. Vou apenas desfrutar de sua companhia até nosso derradeiro fim, minha filha.

- Quem é você?

- Eu sou Nob. A Mãe de todas as estrelas de Nobiloria.


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