quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

A Jornada de Esperança - Parte V

Planos Dentro de Planos



          O Comandante Viatilis observava atentamente as telas mentais de Aldhafera. A maioria mostrava o final da batalha nos arredores de Altalun, enquanto três delas mostravam o Quasar de Nobiloria, a Nave Esperança e a visão que o Capitão Mersonii tinha da cópia do Marechal Sinuhe. A imagem do duplo do Marechal dissolvendo-se no ar chamou a atenção dele.  Focou sua mente na alma sobrevivente e acompanhou a jornada dela até a Nave Capitânia Miaplacidus. Chegara a hora da verdade. De saber o quanto da memória do duplo seria absolvida pelo Sinuhe original. Viu o momento em que o Marechal solicitou uma imagem do Quasar. Com a ajuda de Clymene foi capaz de determinar o quanto de informação a fusão das almas proporcionou. Ao receber os resultados soltou um pensamento de alívio:

- Foi pouco, muito pouco, meu amigo, o que receberas de seu duplo. Posso continuar trabalhando em Aldhafera sem preocupações adicionais. Não é apenas uma fuga o que tenho planejado. Em breve lhe tirarei essa tristeza, Sinuhe.

Viatilis colocou todas as telas de Aldhafera observando o vôo de Esperança. Quando viu que a nave atravessou com segurança a borda de Nobiloria, contatou a mesma:

- Parabéns pela manobra, Capitão Mersonii. Como estão todos?

- Estamos todos bem, Comandante Viatilis. O esforço para proteger a nave das radiações quânticas foi menor que o esperado. Com apenas metade da tripulação é possível manter tudo funcionando.

- Mais ótimas notícias, meu caro. Então seguiremos como planejado. Vou começar a replicação de sua tripulação amanhã. Será um a cada noventa e seis horas. As linhas de montagem das naves-bombas e mísseis de antimatéria já estão em construção. Creio que estaremos em produção dentro de quinze dias.

- Vamos mesmo fazer isso, Viatilis? Vamos destruir cada estrela de Nobiloria em que a GOE habita? Teremos milhares de cópias desta tripulação executando missões suicidas?

- Tudo vai depender da forma como a GOE irá reagir ao perceber que somos capazes de roubar-lhes o comando de sua poeira de nanomáquinas e por meio delas controlar seus drones de batalha.

- Vírus de computadores. Abandonamos há tanto tempo o uso de programas baseados em memória volátil, utilizando apenas memórias físicas não regraváveis, justamente para evitar a invasão da GOE em nossos sistemas e jamais pensamos que este também poderia ser um ponto fraco dela. Como ela irá reagir a isso?

- Acredito que a resposta será violenta, e por isso quero estar com toda a frota e os cinco mundos restantes bem armados com mísseis de antimatéria. Caso essa última linha de defesa falhe, aí sim, destruiremos todas as estrelas que a GOE habita. O pulso eletromagnético gerado pelo colapso de uma estrela por antimatéria é a arma definitiva contra essas máquinas. Não há escudo eletrônico que resista a esses pulsos. Apenas os escudos psíquicos são capazes.

- O quanto da poeira de nanos já temos sobre nosso domínio?

- Cada mundo orgânico já está dentro de uma esfera de sete anos luz com nuvens de nano máquinas dominadas. As principais rotas de comércio entre os mundos também estão dominadas. A taxa de crescimento é de dez por cento por semana. Estamos mantendo a nossa reprogramação inativa. A GOE só vai perceber essa “traição” depois que os sistemas de mísseis de antimatéria estiverem totalmente operacionais.

- E quando o Comandante vai colocar nosso Marechal a par desta parte dos planos?

- Somente quando os sistemas de mísseis estiverem prontos para serem instalados.

- Agora que a alma dele está unificada, sua capacidade psíquica aumentou muito. Nós percebemos a mente dele tentando vasculhar o feixe de quasar onde estamos. Acha mesmo que irá conseguir manter em segredo as naves-bombas de antimatéria com seus pilotos suicidas?

- Você e sua tripulação, Mersonii, são as mentes mais poderosas que já criei. Quando uma nave entrar na linha de produção já vai ter um piloto encobrindo a existência dela. Uma réplica de um de vocês. Os escudos psiônicos que vocês produzem são os mais perfeitos. Nada vai descobrir o que vocês esconderem, muito menos Sinuhe.

- A GOE hoje domina quinze mil estrelas, inclusive a Sagrada Nob. O que vai acontecer conosco, os originais, quando essas milhares de réplicas perecerem? Todas essas cópias de almas virão até nós, Comandante?

- Sim. Elas irão se fundir em vocês. Foi por isso que lhes dei uma educação tão rígida. Foi por isso que incuti na moral de cada um de vocês, tantos valores. Foi por isso que lhes ensinei tanta ética. Se chegarmos ao extremo de destruir as quinze mil estrelas da GOE, você e sua equipe acumularão tanto poder pela fusão das almas de suas réplicas, que serão os novos deuses da Via Láctea. Essa era a verdadeira razão pela qual os antigos proibiram a replicação de seres pensantes ainda vivos. Quando dividimos uma alma obtemos duas idênticas, mas quando elas se fundem, a resultante é sempre maior que a original. Serão vocês que formarão a última linha de defesa dos orgânicos.

- Espero que sejamos merecedores de tanto poder, Viatilis.

- Utilizem o poder apenas para proteger e servir, Mersonii, e tudo dará certo. Não vou perturbá-los mais, meus filhos. Sei que todos estavam escutando essa conversa. Vocês já estão quase atingindo a distância máxima de capacidade de comunicação de Aldhafera. Não poderei mais contatá-los. Qualquer comunicação no futuro vai depender de você, Plumbia. Que Nob os guiem nessa jornada.

- Prometo manter o contato, Comandante, pelo menos uma vez ao mês. Queremos saber como as coisas irão evoluir aí. Obrigado e que Nob oriente seus atos.


Viatilis ficou feliz com a resposta de Plumbia e sentiu a imagem mental de cada um dos tripulantes de Esperança batendo continência. Ele retribuiu o gesto e encerrou a comunicação. As telas de Aldhafera agora mostravam apenas as imagens rotineiras do sistema de vigilância.


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